Nos últimos anos, subiu o índice de suicídio na população entre 40 e 64 anos. Por quê?
Em 2004, nos EUA, 32 mil mortes foram oficialmente atribuídas a suicídio. Ampliando a faixa da meia-idade, constata-se que, dessas mortes, mais de 14 mil são de pessoas entre 40 e 64 anos. Segundo o “New York Times”, o fenômeno não seria apenas americano: um estudo recente aponta que, em 80 países, as pessoas de meia-idade são as menos “felizes”. As explicações são hipotéticas.
Por exemplo, no que concerne às mulheres, desde 2002, diminuiu fortemente o uso da reposição hormonal na menopausa. Talvez o déficit de estrógeno tenha efeitos depressivos diretos ou indiretos.
Também observa-se que pessoas de meia-idade são grandes consumidoras de antidepressivos. Talvez um uso vacilante dessa medicação (com interrupções brutais sem acompanhamento psiquiátrico) seja responsável por momentos de aflição irresistível. Mas é mais provável que, no caso, o consumo de antidepressivos seja apenas prova suplementar de que as pessoas dessa idade são especialmente “vulneráveis”.
Em suma, resta a pergunta: o que acontece, entre os 40 e os 64, que levaria ao suicídio mais indivíduos do que em outras faixas etárias?
Sabemos que as adversidades desesperam os adolescentes porque eles têm dificuldade em enxergar um futuro possivelmente diferente.
E imaginamos com facilidade que as enfermidades e o sentimento do fim que se aproxima possam levar alguns idosos a precipitar o desfecho. Mas adultos na plena força da vida?
É claro, a meia-idade é a época em que os executivos que perdem seu emprego ficam no limbo -demasiado qualificados e já “velhos” para retomar sua carreira. Mas, nos exemplos trazidos pelo “New York Times”, os suicidas de meia-idade não parecem ser vítimas de crises profissionais.
Algumas observações:
1) Nas últimas décadas, mesmo nas fileiras de quem acredita em Deus ou na revolução futura, vem se impondo a vontade (ou a necessidade) de justificar a vida “por ela mesma”. As aspas servem aqui para lembrar que ninguém sabe o que isso significa. Alguns pensam nos prazeres que eles se permitem, outros na satisfação de serem úteis ao próximo, outros ainda avaliam a qualidade estética de sua história ou valorizam a variedade e a intensidade de suas experiências. Seja como for, a vida deveria valer a pena pelo que a gente faz, pela própria experiência de viver.
2) Acrescente-se que, a partir dos anos 60, os adultos de nossa cultura começaram a se preocupar com a adolescência -ou seja, entre outras coisas, passaram a querer furiosamente que suas crianças se preparassem para elas serem “felizes” um dia (em todos os sentidos: sucesso amoroso e financeiro, êxtase, bom humor permanente).
3) Chegam hoje à meia-idade as gerações que cresceram esperando uma “felicidade” que daria sentido à longa “preparação” de sua adolescência e convencidas de que a vida deve se justificar por ela mesma. Os que fracassaram têm sorte: eles podem se dizer que a coisa não deu certo. Os que se acham bem-sucedidos esbarram, inevitavelmente, numa questão inquietante: “Então, é isso? Era só isso?”.
Estreou na sexta passada “Antes de Partir”, de Rob Reiner, com Jack Nicholson e Morgan Freeman. É a história de dois homens que aprendem que eles têm seis meses de vida, escrevem uma lista das coisas que gostariam de fazer antes de morrer e saem pelo mundo afora. Alguns críticos adoraram, outros acharam que os atores não salvam um roteiro em que as últimas vontades dos protagonistas parecem oscilar entre a obviedade (beijar a moça mais linda, pular de pára-quedas, fazer um safári) e a pieguice (reencontrar os que a gente ama de verdade, causar alegria na vida dos outros etc.).
Para mim, é a própria trivialidade da lista dos dois amigos que faz o charme do filme. Na hora de bater as botas, diante da pergunta “Que mais poderia ter sido minha vida?”, é tocante constatar que, no fundo, gostaríamos que tivesse sido mais do mesmo.
by Calligaris
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