Estive lendo alguns livros na área de Educação e acho importante recomendar textos que falam das novas propostas pedagógicas como uma realidade e não como uma utopia. O que me cansa na educação é esse discurso repetitivo sobre como é muito difícil mudar (porque depende do governo, porque depende de verba, porque depende de x, de y… enfim, tudo é motivo para dizer que não dá pra mudar) e o que já sabemos, na prática, que mudar é possível quando existe um desejo que mova essa mudança.
Hoje vou comentar um pouco sobre o livro “Ensino Fundamental: Conteúdos, Metodologia e Práticas”, organizado por Selva Guimarães Fonseca (Ed. Alínea). Apesar do título, o livro discute muito mais do que propostas de ensino fundamental. Ele é dividido em disciplinas (Português, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes e Educação Física) e em cada uma delas apresenta dois ou três artigos de pesquisadores e professores do tema.
No item Português, os artigos discutem essa idéia de que para se ensinar a ler é preciso ensinar a escrever, como se fosse uma habilidade única. Já sabemos (ou pelos menos deveríamos já saber) que são momentos diferentes no aprendizado de uma língua, e também sabemos que um apaixonado por leituras não será necessariamente um escritor, e vice-versa. Uma proposta feita nesses artigos é de ensinar a ler pela via da oralidade. Perde-se muito tempo tentanto “incentivar” a meninada a ler, e não percebem que para que um aluno goste de ler, ele precisa aprender a ler para além da decoficação de signos linguísticos. E a escola erra nisso, porque propõe leituras obrigatórias, porque pede produção escrita após toda leitura, e porque não “perde tempo” lendo com seus alunos. Parece simples, uma coisa boba, mas não é. O simples fato de ler junto com os alunos é a maneira mais simples de se “incentivar” a leitura.
Meus filhos adoram ler. Eu adoro ler e minha mãe adora ler. Não me lembro de ela ficar me dizendo, quando criança, para ler. Mas ela lia tanto, que foi natural pra mim o gosto pela leitura. E o mesmo aconteceu com meus filhos. Escuto o tempo todo pais me pergutando qual é o segredo, e quando pergunto: “Mas você lê, gosta de ler?”, e eles: “Ah, eu detesto, se li um livro nos últimos cinco anos, é muito” , que mágica esperam, então? A leitura é um hábito, e só acontece em um meio propício para isso. Portanto, é esse “ensinamento” que deve ser feito com as crianças. Um professor que lê com os alunos, que mostra as coisas boas ligadas a leitura no simples processo da oralidade está contribuindo muito mais para criar futuros leitores, do que um professor que ainda está preso a produção escrita pós leitura obrigatória.
“Leia para seus alunos, partilhando com eles as conexões que faz ao ler. Quando conectamos nossas experiências com novas informações, ficamos mais aptos para o engajamento na leitura e para compreendê-la. Não há nada mais poderoso do que um professor alfabetizador partilhar sua paixão por ler, escrever e pensar.” (Página 38)
“Antes de incentivar, ou concomitantemente, para ser mais cuidadoso, é necessário ensinar a ler – não para entender o funcionamento do sistema linguístico, mas para estabelecer conexões intelectuais com o objetivo formidável de atribuição de sentidos” (Página 46)
No outro artigo que trata da produção escrita, se discute o erro comum dessa nossa pedagogia velha, que é ensinar gramática pura e achar que esses ensinamentos produzirão autores. Ora, que espaço existe hoje na escola para a produção escrita, livre de regras gramaticais e objetivos mil? O que temos como resultado disso são crianças e adolescentes que conhecem as regras e o código linguístico, mas que não sabem escrever textos, não sabem se fazer entender pela escrita. Bakhtin já dizia isso, quando falava que a linguagem não pode ser vista como um sistema fechado, acabado, porque isso não daria espaço para o surgimento de autores. O que acontece é que a escola gasta muito tempo com a gramática, como se dominar regras criasse escritores-autores.
“Professora, quantas linhas? – Quando o aluno entender que produzir um texto é produzir linguagem, quem sabe não será preciso responder a essa comum pergunta feita por alunos que não se apropiaram do que de fato significa a produção de texto narrativo de ficção.” (Página 69)
Para não ficar muito longo o post, vou deixar pra falar das outras disciplinas depois. Mas espero que tenha deixado vocês curiosos o suficiente pra ler o livro todo. E o mais importante, além de de ler, mudar suas práticas.
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