Na Reunião de 11 de março de 1908, o tema de discussão dos primeiros psicanalistas era “A posição natural da mulher”. Wittels fez uma conferência sobre a menstruação, desenvolvendo uma hipótese de que na era glacial, a mulher era objeto de veneração dos homens, por isso as relações eram poliglotas; mas perdeu esse lugar com a invenção da propriedade, já que a partir dai os homens queriam que seus filhos herdassem sua terras e passaram a sustentar a necessidade de monogamia. Wittels encerra sua conferência afirmando que uma das consequências desse tempo é a invenção do feminismo, já que as mulheres passaram a lamentar não terem nascido homens e buscam tornar-se um. Wittels enxerga isso como um absurdo.
Na discussão, Sadger acha que a conferência possui muitos erros e não concorda com Wittels. Urbantschitsch acha a hipótese de Wittels genial. Hitschmann acha que o autor da conferência criou um texto fantasioso e trata-se apenas de um reacionário juvenil.
Freud, sobre a discussão, explica que a hipótese de Wittels é fantasiosa e afirma que “as mulheres, como grupo, não ganham nada com os movimentos feministas modernos. Quando muito, os ganhos são apenas individuais” (fazendo referência ao texto da Stuart Mill, Sobre a emancipação feminina).
Adler faz uma fala contundente: chama Wittels de reacionário e diz que o socialismo propõe um quadro de família já abalado, “que as mulheres não tolerarão que a maternidade as impeça de exercer uma profissão”. Ele prossegue, citando Marx, para afirmar que a questão da propriedade já havia sido discutida por ele.
Wittels encerra afirmando que a menstruação é a principal diferença entre o homem e a mulher e que é impossível ser freudiano e social-democrata ao mesmo tempo, e que por isso Adler é contraditório.
Bom, é possível notar que: (1) ser psicanalista e marxista não é uma invenção atual, tai Adler em 1908 referindo-se ao marxismo pra sustentar sua posição de analista. (2) a construção de teorias psicanalíticas a partir de posições políticas também não é novidade, é perceptível nessa reunião a briga entre psicanalistas conservadores e “modernos”, e como isso influencia nas teorizações que eles propõem. (3) Freud não fala de política, mas marca sua posição ética quando afirma que uma mulher não ganha muito com movimentos de grupo, já que, segundo ele, os ganhos são apenas individuais. Não deixa de ser interessante observar que hoje escutamos muitas mulheres reclamando de grupos feministas (extremistas, tomados por ideais), um paradoxo, já que as mulheres sem predicação não cabem em lugar nenhum. (4) nenhuma mulher psicanalista participava dessas reuniões das quartas-feiras nesses primeiros anos.
Apenas acho um pouco frustrante perceber que não produzimos nada muito diferente desses discursos hoje, em 2017. Que estamos sempre girando em torno de uma mesma coisa, isso é um fato; a frustração é sobre a nossa repetição automaton na condição de civilização.
Livro: Atas da Sociedade Psicanalítica de Viena, Vol. 1 – os primeiros psicanalistas 1906-1908.
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